Pródromos

Os meios de comunicação ocidentais, em mãos privadas, costumam silenciar sobre muitos temas e muitas notícias quando estas não os convêm.

O Projeto Mais Bonito do Século

Escola Latino-americana de Medicina (ELAM)

Músicas que você deve ouvir #01

Seleção de algumas músicas que você deve ouvir.

Cuba na Unesco

“O mundo vive indignado. Os povos se rebelam contra as injustiças e as promessas vazias. Se indignam pelas frustrações acumuladas e pela ausência de esperanças. Se rebelam contra um sistema devastador que já não pode seguir enganando com um falso rosto humano."

Populismo x Chavismo: Diferenças históricas

Desde a ascenção de Chávez na Venezuela a mídia de todo o mundo tem feito uma campanha para desmoralizar o processo revolucionário e um dos meios utilizados é a ridícula comparação com o populismo.

O Triunfo de Chávez



1. A primeira década do século XXI foi marcada pela presença marcante do fenómeno Hugo Chávez, eleito no dia 2 de fevereiro de 1999 para o cargo de Presidente da República da Venezuela. Sua posições política progrediram através de um mandato de um nacionalismo contido ao anti imperialismo e ao socialismo. Hugo Chávez se declara um revolucionário e o seu regime tem o sido na medida em que desmonta a estrutura liberal do Estado venezuelano, cria novas instituições e cerceia as remanescentes, destruindo o velho instrumento oligárquico e colocando outro em seu lugar. Neste processo Chávez dá uma ótima lição de como tomar poder e subverter a antiga ordem, visto que nas presentes condições o chavismo na Venezuela é implacável e hegemônico, como veremos a seguir.

2. Hugo Chávez conta com forte base e apoio popular. Procura envolver o povo da maior forma possível no processo, não só através de propaganda massiva e políticas ecônomicas populistas, mas também através de um partido de massas amplo e militante somado a novas instituições de cunho participativo(Consejos Communales) que transmitem a sensação de responsabilidade e cumplicidade no povo. Chávez aumenta seu próprio poder e legitimidade ao dividir poderes com o povo.
Chávez é uma figura carismática, icônica, caudilhesca. Sua liderança e seu pensamento que inspiram toda uma revolução configuram uma dominação que podemos chamar de carismática. Teve virtú que forjou sua imagem providencial ao insurgir contra um governo extremamente impopular num momento de grande confusão e pobreza. A fortuna o compensaria posteriormente já que uma Venezuela em frangalhos o elegeria para Presidente, o que reforça seu caráter providencial.

"Deve, pois, alguém que se torne príncipe mediante o favor do povo, conservá-lo amigo, o que se lhe torna fácil, uma vez que não pede ele senão não ser oprimido. (...)Concluirei apenas que a um príncipe é necessário ter o povo como amigo, pois, de outro modo, não terá possibilidades na adversidade. "
- Maquiavel, "O Príncipe"

"Agora eu triunfei pelo apoio de uma facção, quer dizer que esse acontecimento não pode se realizar senão no meio de uma profunda disensão interior. Eu posso dizer ao acaso, mas sem me enganar quais são as causas. Seria um antagonismo entre a aristocracia e o povo ou entre o povo e a burguesia. No fundo, não pode ser senão isso, na superfície será uma confusão de ideias, opiniões, de influências e de correntes contrárias, como em todos os Estados nos quais a liberdade terá tido um momento de revolta. Haverá lá elementos políticos de toda espécie, restos de partidos outrora vitoriosos e hoje vencidos, ambições desenfreadas, cobiças ardentes, ódios implacáveis, terror por todo lado, homens de todas as opiniões, de todas as doutrinas, restauradores de antigos regimes, demagogos, anarquistas, utopistas, todos com mãos à obra, todos trabalhando igualmente por seus lados, pela mudança da ordem estabelecida. (...) no meio dessa divisão de partidos não existe uma força real ou acima senão uma, o povo.

Eu sou, eu mesmo, um pretendente vitorioso, eu trago, suponho, um grande nome histório próprio para agir sobre a imaginação das massas. Como Pisístrato, como César, como Nero mesmo; eu me apoiarei sobre o povo, aí está o "a", o "b" e o "c" de todo usurpados. Lá está o poder cego que dará o meio de tudo fazer impunemente, é a autoridade, é o nome que cobrirá tudo. O povo com efeito se inquietará bem com vossas ficções legais e vossas garantias constitucionais!"
- Maquiavel ficticio de Maurice Joly, em "Diálogo no Inferno entre Maquiavel e Montesquieu", Oitavo Diálogo

"A base de toda autoridade está no proveito daquele que obedece." - Napoleão Bonaparte

3. Chávez tem um bom timing, sabe que cada coisa tem sua hora, sabe conduzir o processo de forma gradual - o povo se assusta com mudanças graduais. Aprendeu bem a lição de que Maquiavel de que a virtude de um Príncipe consiste na flexibilidade para agir segundo as circunstâncias, lição por sinal bem demonstrada por seu maestro Fidel Castro. Sempre cuidadoso, nunca se comprometeu antes da hora certa, indo de um discurso amplo e vago para um mais consistente e definido, pois como disse Napoleão "a melhor maneira de manter sua palavra é nunca dá-la".

"Eu não destruiria diretamente as instituições, mas eu as tocaria uma a uma com um toque de mão imperceptível que lhes desarranjaria o mecanismo. (...) Por baixo das leis primitivas eu faria passar uma legislação nova que, sem anular expressamente a antiga, a disfarçará primeiro, mais tarde a apagará completamente." - Maquiavel ficticio de Maurice Joly, em "Diálogo no Inferno entre Maquiavel e Montesquieu", Oitavo Diálogo

"Em matéria de sistema, sempre é preciso se reservar o direito de rir no dia seguinte de suas idéias da véspera." - Napoleão Bonaparte

4. A constituição já tem a marca bolivariana, a própria República da Venezuela se chama República Bolivariana da Venezuela. Chávez se converteu num fundador de Estados - o próprio Estado tem a sua imagem, e além de ocupar o Executivo mantém hegemonia sob o legislativo(o PSUV mantém mais de 50% das cadeiras da Assembleia Nacional) e a posição de padrinho do poder popular. A influência de Chávez já permitiu em alguns momentos o poder excepcional de legislar por decreto e constatemente ele apela para sua força popular através da arma dos referendos e plebicistos - o ápice da democracia sendo usado contra a democracia liberal, o voto popular se torna um instrumento de governo.

A oposição, mal organizada e desprovida de um líder como Hugo Chávez, se vê obrigada a jogar segundo as regras da legalidade bolivariana ou violar a mesma com o risco de sofrer a devida punição.
"E o voto popular, do qual eu farei instrumento do meu poder, tornar-se-á a base mesa de meu governo.

5. O exército já foi expurgado, reformado e doutrinado. Proclama o lema da Revolução Bolivariana: "Pátria socialista ou morte!" O tenente-coronel Chávez é uma figura inspiradora para todas as Forças Armadas, leais a ele e a sua Revolução. Não obstante, ainda arma o povo com a chamada Milícia Nacional Bolivariana. O poder das armas está com Chávez.

6. A hegemonia ideológica vem sendo conquistada. O anterior domínio da mídia pelas oligarquias foi abalado e estas agora dividem o espaço informativo com o Estado. Nas escolas os jovens já aprendem os fundamentos do sistema em que vivem, pessoas são alfabetizadas com princípios da Revolução Bolivariana e bases do Partido fazem intenso trabalho ideológico nos comitês populares. O próprio Presidente dá orientações através da imprensa, do rádio e da televisão. Mesmo em programas de formação profissional existe o elemento de formação ideológica, vide a Missão Che Guevara.

A criação de novas Universidades e consequente ampliação do acesso a elas permitirá a criação de uma intelectualidade bolivariana(ou pelo menos em débito com o chavismo) e de um novo grupo de técnicos que acabará com o poder de barganha e tendência de oposição do velho - os "técnicos burgueses" serão substituidos pelos "técnicos bolivarianos", aumentando a independência do regime.

7. O Estado aumenta o seu papel na economia e o faz de forma política(não meramente intervencionista). Surge a arma econômica contra a oligarquia e certos setores do empresariado.

8. A oposição tem se limitado plano da política e negilgenciado o plano do político. O poder de Chávez não se reduz a um cargo no executivo e a cadeiras na Assembleia Nacional, se estende para todo o tecido social. O Estado já é bolivariano e o povo é educado para tal - a questão vai muito além do número de votos. A oposição é fraca, a oligarquia se encontra em frangalhos e a classe média reduzida(lembrando que esta é somente um terreno fértil para opositores, mas não inimiga por natureza do chavismo). Tendo estes fatores expostos em conta é perfeitamente razoável afirmar: O TRIUNFO DE HUGO CHÁVEZ FRIAS É IMPLACÁVEL, O SISTEMA É HEGEMÔNICO E NÃO EXISTE UMA ALTERNATIVA AO ATUAL MODELO BOLIVARIANO.

Fontes de citações:

"DIÁLOGO NO INFERNO ENTRE MAQUIAVEL E MONTESQUIEU" de Maurice Joly, Edipro, São Paulo, 2010.
"NAPOLEÃO BONAPARTE - Manual do Líder - Aforismos escolhidos e prefaciados por Jules Bertaut" Napoleão Bonaparte, L&PM, 2006, Porto Alegre.

O nome político do amor

Por que o socialismo, em tese uma alternativa humanitária ao capitalismo, fracassou na Europa e na Ásia? O capitalismo teve a esperteza de, ao privatizar os bens materiais, socializar os bens simbólicos. De dentro do barraco de uma favela uma família miserável, desprovida de direitos básicos como alimentação, saúde e educação, pode sonhar com o universo onírico das telenovelas e ter fé de que, através da loteria, da sorte, da igreja que lhe promete prosperidade ou mesmo da contravenção, haverá de ter acesso aos bens supérfluos.

 O socialismo cometeu o erro de, ao socializar os bens materiais, privatizar os simbólicos, e confundiu crítica construtiva com contra-revolução; cerceou a autonomia da sociedade civil ao atrelar ao partido os sindicatos e movimentos sociais; coibiu a criatividade artística com o realismo socialista; permitiu que a esfera de poder se transformasse numa casta de privilegiados distantes dos anseios populares; e cedeu ao paradoxo de conquistar grandes avanços na corrida espacial e não ser capaz de suprir devidamente o mercado varejista de gêneros de primeira necessidade.

 Hoje, resta Cuba como exemplo de país socialista. Todos conhecemos os desafios que a Revolução enfrenta às vésperas de seu meio século de existência. Sabemos dos efeitos nefastos do bloqueio imposto pelo governo dos EUA e de como a queda do Muro de Berlim deteriorou a economia da Ilha.

 Apesar de todas as dificuldades, nesses 49 anos a Revolução logrou assegurar a 11,2 milhões de habitantes os três direitos básicos: alimentação, saúde e educação. Elevou a auto-estima da cidadania cubana, que tão bem se expressa em suas vitórias nos campos da arte e do esporte, bem como na solidariedade internacional, através de milhares de profissionais cubanos das áreas da saúde e da educação presentes em mais de uma centena de países do mundo, em geral em regiões inóspitas marcadas pela pobreza e a miséria.

 O socialismo cubano não tem o direito de fracassar! Se acontecer, não será apenas Cuba que, como símbolo, desaparecerá do mapa, como ocorreu à União Soviética. Será a confirmação da funesta previsão de Fukuyama, de que “a história acabou”; a esperança – uma virtude teologal para nós, cristãos – findou; a utopia morreu; e o capitalismo venceu, venceu para uns poucos – 20% da população mundial que usufrui de seus avanços – sobre uma montanha de cadáveres e vítimas.

 Nós, amigos da Revolução cubana, não esperamos de Cuba grandes avanços tecnológicos e científicos, serviços turísticos de primeira linha, medalhas de ouro em disputas desportivas. Esperamos mais do que isso: a ação solidária de que falava Martí; a felicidade de um povo construída em base a valores éticos e espirituais; o princípio evangélico da partilha dos bens; a criação do homem e da mulher novos, como sonhava o Che, centrados na posse, não dos bens finitos, e sim dos bens infinitos, como generosidade, desapego, companheirismo, capacidade de fazer coincidir a felicidade pessoal com os sucessos comunitários.

 Em resumo, almejamos que, em Cuba, o socialismo seja sempre sinônimo de amor, que significa entrega, compromisso, confiança, altruísmo, dedicação, fidelidade, alegria, felicidade. Pois o nome político do amor não é outro senão socialismo.

Frei Betto é escritor, autor de “A mosca azul – reflexões sobre o poder” (Rocco), entre outros livros.

O Comunista e a miséria

Sou comunista desde que lembro ter suficiente consciência política e um mínimo de leitura para essa auto determinação. Aos 14 anos me filiei ao PCB e mesmo sem poder votar fiz assídua campanha para meu candidato, na época, Roberto Freire que, diferentemente de mim, tomou outros caminhos e hoje é a antinomia do marxismo e do movimento político que lhe dá vazão prática: o comunismo. Hoje não possuo partido. Não por desacreditar na política ou por acreditar que existe possibilidades de mudanças efetivas sem partidos, mas simplesmente porque observo não haver partidos no campo do marxismo que de fato mereçam tal denominação.

Mas esse relato está longe de ser o centro daquilo que pretendo me reportar, na realidade apenas serve para que o leitor saiba que quem lhe escreve é de fato um comunista autêntico e incorrigível e que passou por todas as provações impostas pelo tempo que me colocou diante do colapso do socialismo no leste europeu. Ainda assim, me orgulho de nunca ter nem mesmo flertado com outra concepção filosófica que o marxismo ao qual me mantive sempre leal apesar de ser essa lealdade sempre aberta ao debate e aos estudos de outros autores não marxistas os quais, sem eles, não poderia me afirmar quem sou, por não conhecê-los.

O que me leva, enfim,  a escrever essas linhas foi um fato corriqueiro e tão pitoresco quanto frequente, mas que só agora me vejo disposto a escrever sobre o mesmo. Jogando xadrez pela internet notei que meu oponente ficou surpreso ao saber que eu era comunista. Ele salientou que parecia haver uma contradição entre eu ser comunista e possuir um Ipad da Apple o qual seria, segundo ele, um símbolo do capitalismo. Respondi-lhe que sua colocação mostrava, de fato, pouco conhecimento sobre ser comunista e que como comunista eu não via qualquer contradição de usar uma mercadoria de uma empresa capitalista, pois basicamente todas as mercadorias são feitas pelo modo capitalista de produção em nosso tempo. O que ele sugeria? Que eu abandonasse o universo das mercadorias e vivesse a pão e água (que embora também sejam mercadorias, talvez sejam menos “símbolos” do capitalismo)?

Para encerrar o debate apenas lembrei-lhe de que o Ipad era feito na China - país dirigido por um partido comunista - e que então a incoerência seria dele em usar um produto feito em um país comunista e se dizer capitalista. Confesso que essa resposta foi apenas uma saída retórica para um debate que não poderia produzir qualquer efeito positivo nas condições limitadas de tempo e espaço as quais estávamos colocados. Posteriormente, descobri que meu oponente era igualmente fraco e incoerente na estratégia do xadrez e após esse jogo ele nunca mais desejou uma outra partida comigo.

Porém, esse fato que ocasionalmente sempre bate em minha porta creio eu, mereça um esclarecimento a todos aqueles que muito embora se dizem não comunistas, não leram Marx e nem mesmo sabem o que pensam e qual mundo os comunistas defendem.

O comunismo não é nem a defesa e nem a valorização da pobreza e dos pobres. Somos contra a existência da pobreza e dos pobres porque sabemos que ambos são produtos de relações injustas de exploração conduzidas por uma elite dominante que acumula riqueza através de relações sociais de produção objetivas e mantidas sobre um Estado que lhe garante a propriedade privada dos meios de produção.

Assim, um comunista não deseja que todos sejam igualmente pobres, ao contrário, desejam que todos possuam oportunidades iguais em um mundo onde a exploração do trabalho seja abolida e assim as relações sociais e a própria vida possa vir a ter um verdadeiro sentido e significado para os Homens.

Os comunistas também não possuem qualquer oposição à tecnologia de ponta, nem no uso cotidiano e nem na produção. Para nós está claro que a tecnologia não é nociva, porque ela mesma é uma criação humana e, assim não possui desejo e ação próprias. Assim, um robô não rouba um emprego e nem é a informática a grande responsável pelos altos índices de desemprego dos países industrializados. Sabemos que essa é uma falácia das elites dominantes que querem tirar da esfera da luta de classes a questão do desemprego para afirmar que o mesmo é “estrutural” e “inevitável” e que elas - as elites - inclusive lamentam esse fato, mas nada podem fazer. Na realidade, se o desemprego está na casa dos 20% no mundo inteiro uma simples redução da jornada de trabalho de 40 horas para 32 horas semanais, praticamente eliminaria o desemprego “estrutural”. Mas sabemos que o desemprego pressiona os salários para baixo e que longe de ver seu fim as elites querem seu aumento e perpetuação, pois o mesmo lhe dá condições bem agressivas de lucro através da exploração do trabalho.

Nós comunistas somos a favor da tecnologia, seu acesso a todos e de qualidade bem superior àquela que temos acesso hoje, geralmente feita para ser rapidamente superada e por isso sempre frágil e efêmera, gerando um enorme volume de lixo tecnológico altamente poluente e danoso para as economias de todos os indivíduos que são escravizados pelas mesmas necessidades que nunca são saciadas (um amigo meu me contou certa vez que já havia comprado quatro geladeiras em 10 anos e que sua avó tinha apenas uma antiga a mais de 40 anos e que gelava e funcionava melhor do que a dele...).  No mundo que defendemos, a tecnologia estará a serviço dos Homens e não a serviço do capital, será libertadora e não opressiva, será durável e não efêmera, será racional e não irracional.

Enfim, muitos acreditam que os comunistas são contrários ao consumo e que desejam um mundo quase de mosteiros onde viveríamos de forma simples e singela em um mundo quase sem cores e opções. Aqui aproximam definitivamente os comunistas das ordens franciscanas ou beneditinas. Em hipótese alguma somos contra o consumo - mesmo aqueles que são caracterizados como de bens supérfluos, isto é, os quais virtualmente viveríamos (ou melhor sobreviveríamos) sem.

Acreditamos que uma mente e uma personalidade complexa que vive uma vida ativa frequentando os mais diversos ambientes sociais não apenas pode, como deve se valer de grande variedade de vestimentas, calçados e ornamentos. Apenas somos contrários à ditadura imposta pela indústria da moda que impõe padrões sazonais de beleza e que não colocam à disposição dos Homens variedade e pluralidade, mas sim sentenciam o que é o belo e o que deve ser usado por todos e condenam à fogueira aquilo que há um ano elas afirmavam ser o máximo da beleza.

Acreditamos na possibilidade de um mundo onde os Homens possam desenvolver uma autentica personalidade e a partir da mesma usar as vestimentas que ele julga serem compatíveis com sua identidade, um mundo onde o belo não seja definido pelo mercado e pela necessidade da indústria capitalista lucrar cada vez mais e - igualmente - gerar mais e mais lixo em um processo igual de obsolescência programada, também conhecido como consumismo. Assim, no capitalismo não vemos liberdade de opção, vemos imposição de padrões e uniformidade na maneira de se vestir, de se portar e de se calçar, em um pavoroso mundo massificado e sem vida autêntica.

Por fim, ser comunista em hipótese alguma está em contradição com o uso e admiração das tecnologias que estão à venda, bem como o uso e o vestir daquilo que nossa sociedade produz. Queremos deixar bem claro que não julgamos os avanços tecnológicos, nem a arte, que muitas vezes está também nos ornamentos, nas vestimentas, no talento de um músico, de um pintor ou de um romancista, como mercadorias de propriedade exclusiva dos capitalistas. Ao contrário eles todos pertencem ao gênero humano, gênero este que em sua maior parte é tão explorado e excluído pelo capital de tudo o que é belo e superior e condenado apenas ao fundamental e ao básico para a sua sobrevivência.

Desejamos que a riqueza que sempre é produzida socialmente seja de toda a sociedade e que cada Homem receba aquilo que mereça medido por aquilo que ele produz e que, assim, cada Homem possa ter a oportunidade de ser medido por aquilo que de fato é, e não por aquilo que ele possuí ou pelo poder e privilégio que ele detém.

Sabemos que esse mundo não será alcançado sem lutas e sem grandes sacrifícios, mas acredito realmente que o socialismo é a única forma de evitar que todos os nossos piores pesadelos se tornem realidade e que a Terra se envenene com o lixo do capital, que o ar se torne tóxico pela fumaça da indústria e das frotas congestionadas das grandes cidades que não possuem transporte coletivo adequado e que o gênero humano se degenere em guerras sem fim onde - como escravos das coisas que ele mesmo criou - seja capaz de negar a humanidade de seu semelhante em infindáveis holocaustos.

Como comunista, enfim, desejo um novo mundo o qual teria muito mais que falar, mas que me faltaria espaço. Como revolucionário carrego meu Ipad da Apple e tento ser, agir e me vestir de forma elegante e condizente com minha personalidade, enfim como revolucionário e para manter a coerência naquilo que acredito, uso por vezes aquilo que o gênero humano produziu de melhor e lamento - da forma mais plena e sincera - ser eu um privilegiado por ter acesso a tudo isso que um dia, espero, todos possam vir a ter. Tenho convicção que esse mundo nascerá e como comunista estaria disposto a dar minha própria vida para que esse mundo seja alcançado. Isso é ser um comunista, ou este é o comunista que eu sou.    

Carlos D’Incao

As Dama$ que nunca chegaram a ser Mães.

Teriam as Dama$ de Branco - grupelho mercenário cubano - condições de alcançar o símbolo de lutadoras da liberdade?
A tentativa de levar as “damas” ao símbolo de lutadoras da liberdade, praticada pela mídia hegemônica no mundo, tem uma opositora, que por si só já deveria levar esse grupo de mercenárias para o ostracismo, a nulidade e o desprezo, que o povo cubano lhes confere. 
Essa opositora é Hebe de Bonafini, presidente da associação Madres de La Plaza de Mayo, respeitada por qualquer pessoa minimamente movida por sentimentos humanitários.
A presidente das Madres da Plaza de Mayo assim se referem essas “damas”:
“Essas mulheres defendem o terrorismo. Elas defendem o primeiro país terrorista do mundo, o que tem mais sangue nas mãos, o que lança mais bombas, o que invade mais países, o que impõe as sanções econômicas mais duras aos demais. Estamos falando da nação que é responsável pelos crimes de Hiroshima e Nagasaki. Essas mulheres não percebem que a luta das Madres de la Plaza de Mayo simboliza o amor por nossos filhos desaparecidos, assassinados pelos tiranos impostos pelos EUA. Nosso combate representa a revolução, a que nossos filhos e filhas quiseram fazer. Sua luta é diferente, pois elas defendem a política subversiva dos EUA, que somente contém opressão, repressão e morte".

“Pós modernidade”, moda cultural do neoliberalismo

Enraizado no passado do pensamento burguês, o pós-modernismo emergiu em contraposição ao
marxismo e prega a fragmentação e o “vale-tudo” cultural, o apoliticismo, a rejeição ao conhecimento científico e a ideia de que a sociedade (e a história) não podem ser mudadas pela ação coletiva dos homens.

Por José Carlos Ruy (*)


A “pós-modernidade” é um tema que emergiu especialmente após a década de 1970, embora suas teses fossem anteriores. Sua emergência (nos anos 70) refletiu as mudanças que ocorriam no sistema capitalista. O termo “pós-moderno” acaba trazendo alguma confusão para os desatentos. Há um sentido explícito de superação da modernidade. Ele não representa propriamente uma novidade no campo do pensamento, mas a acentuação de tendências mais antigas e permanentes no pensamento burguês.

Muitas das ideias que surgem como “novidade” estão enraizadas nesse pensamento burguês que vem desde o século 19, com uma ênfase no indivíduo e no conflito (ou contradição) entre este e a sociedade, ideia que se fortaleceu desde Kant (pensador alemão do século 18).

A pós-modernidade enfatiza e superestima o papel individual sobre o social e apregoa isso com um sentido retrógrado, especialmente após a queda do Muro de Berlim e a extinção do socialismo nos países do Leste europeu, quando se proclamou o “fim da história” e a vitória final do capitalismo sobre o socialismo.

O pós-modernismo, como um modismo cultural, é paralelo à hegemonia do neoliberalismo e corresponde a ela. Sua emergência está fortemente vinculada às mudanças ocorridas nos países de capitalismo desenvolvido (na Europa e nos EUA, particularmente) a partir da década de 1960.

Uma derrota para os trabalhadores

O arranjo político estabelecido depois da II Guerra Mundial, que fundamentou o estado do bem-estar social, trouxe para o núcleo do aparelho estatal correntes ligadas ao movimento operário. Partidos socialistas e comunistas e a estrutura sindical passaram a fazer parte do bloco governante, com impacto na própria política defendida por aqueles partidos e organizações.

Quando o capitalismo começou a dar os primeiros sinais da crise de que ainda sofre hoje, mais de meio século depois, o movimento operário representado por aquelas organizações sindicais e políticas não conseguiu formular uma proposta avançada para ela. Refém de políticas reformistas, foram incapazes de assumir papel dirigente quando a resistência operária e popular eclodiu sob forma insurrecional, nos famosos movimentos de 1968. E em países como Itália e França juntaram-se aos governos contra aqueles movimentos.

Neste sentido, a efervescente atividade operária na Europa e nos EUA na década de 1960, decaiu do status de revolução social, de luta de classes, para uma mera transformação cultural. Dava ênfase a aspectos superestruturais (liberação feminina, luta contra o racismo, pela afirmação da juventude etc.) e na resistência contra a guerra do Vietnã.

Isto é, incapaz de formular uma saída proletária para a crise do capitalismo, as organizações políticas e sociais ligadas aos trabalhadores entraram num processo de degenerescência política e eleitoral cuja culminância seria, poucas décadas depois, na crise organizativa vivida a partir dos anos 80.

Aqueles acontecimentos têm uma qualificação: representaram uma derrota para os trabalhadores, para a luta do proletariado e para o avanço para o socialismo. Eles prepararam o caldo de cultura político que, já no final da década de 1970, levou à hegemonia neoliberal com a ascensão de Margareth Thatcher (em 1979) como primeira ministra britânica, a eleição de Ronald Reagan para a presidência dos EUA (em 1980), e à virada privatizante do governo de François Mitterrand (eleito em 1981) na França.

O alto ritmo de crescimento das economias capitalistas, que vinha desde o final da II Guerra Mundial, começou a desacelerar desde o final da década de 1950. Os trabalhadores resistiam também às rotinas alienantes e repetitivas do trabalho nas empresas capitalistas e, ao mesmo tempo, exigiam salários mais altos e condições de trabalho mais adequadas. A saída conservadora para aquela crise deu à burguesia os instrumentos políticos que lhe permitiram dobrar a resistência operária e impor perdas sociais, salariais, e organizativas para os trabalhadores.

Financeirização

Em sua busca para potencializar os lucros, as empresas capitalistas adotaram várias estratégias para derrotar os trabalhadores. Uma delas foi a migração das instalações industriais para locais onde os salários fossem mais baixos e a organização dos operários mais frágil.

Nos EUA, por exemplo, as empresas iniciaram uma migração dos tradicionais centros operários do nordeste do país (como Michigan, Pensilvânia, Nova York) para estados do sul; ultrapassar a fronteira foi um passo, em busca da mão de obra barata na América Latina, transbordando depois para nações mais distantes na Ásia, como a Indonésia ou, na década de 1980, a China.

Na Europa a ânsia por mão de obra barata moveu a produção capitalista rumo ao leste, principalmente depois das mudanças radicais vividas pelas antigas democracias populares do bloco soviético, e também à atração de fortes correntes de migrantes vindos de países latino-americanos, asiáticos e africanos, que vendiam a preços aviltados sua força de trabalho nos países ricos europeus.

Neste período a acumulação capitalista mudou de rumo; a produção fabril, nos países ricos, deixou de ser seu eixo principal, substituída preferencialmente por investimentos financeiros cada vez maiores e mais sofisticados. A produção industrial começou a declinar, o número de trabalhadores ligados à produção encolheu, e houve um acentuado crescimento no setor de serviços. O trabalhador típico deixou de ser aquele que antes manipulava peças de automóveis e seu lugar foi ocupado crescentemente por trabalhadores precarizados.

A ética “produtivista” anterior, que legitimava o lucro obtido na produção e preconizava a vida austera e a economia para o futuro, foi crescentemente substituída por uma lógica de jogo, de cassino, guiada pela lógica do “destino”, do “azar”, sob a qual o que vale é viver o presente (carpe diem, como dizia um filme que fez época, “Sociedade dos Poetas Mortos”).

As mudanças no pensamento acompanham e correspondem a essas transformações ocorridas na sociedade. A França foi um dos lugares pioneiros da formulação do que se convencionou chamar de pós-modernismo. Lá, no pós-guerra, o prestígio do comunismo e da União Soviética foi a base para a presença marcante do marxismo entre os intelectuais e artistas, fomentando um debate cujos desdobramentos ocorreram de forma paralela às mudanças na produção, e na própria luta de classes, que se aprofundou principalmente depois do 20º Congresso do Partido Comunista da União Soviética, em 1956. O choque das denúncias feitas pelo dirigente soviético Nikita Kruschev provocou, inicialmente, uma divisão no movimento comunista, opondo os marxistas que se pode chamar de “ortodoxos” àqueles que manifestavam seu desencanto através da busca de um marxismo “humanista”, sem compromissos claros com a mudança social e a luta de classes, e fortemente crítico em relação à ortodoxia soviética.

Anti-marxismo

O passo seguinte foi o crescente abandono do marxismo por inúmeros intelectuais e a passagem para formas de pensamento que, ainda reivindicando algum precário compromisso libertário (Michael Foucault é um exemplo veemente), que rompiam com a compreensão da história como um processo que pode ser conhecido e no qual se pode intervir, e com o próprio conhecimento científico. Saltavam para o primeiro plano, desta forma, linhas teóricas que defendiam uma história sem processo e enfatizavam o discurso, desprezando a correlação entre o pensamento conceitual, o mundo material e objetivo, e a ação prática concreta dos homens.

Estava aberta a porta, assim, para a hegemonia do “pós-modernismo”, uma forma de pensamento que rompeu com o materialismo e com qualquer compromisso com a compreensão do mundo real e com programas coletivos de intervenção no curso dos acontecimentos. E que corresponde à “lógica de jogo” que passou a predominar, na qual não se pode ter certeza de nada a não ser do efêmero presente – e também que, como nos jogos de azar, há poucos vencedores e muitos perdedores que, por partilhar a lógica do azar, “não podem reclamar” do destino, nem interferir nele.

"Atitude intelectual genérica"

Outra consequência foi a inauguração de um relativismo radical na consideração de todas as atividades culturais, sociais, humanas; esta é a raiz dio “multiculturalismo” que acompanha esta maneira de pensar e que valoriza de forma equívoca a relevância das múltiplas contribuições culturais dos variados grupamentos humanos. Enfim, esta é a faceta do “vale-tudo” pós-modernista, em cuja esteira estão: a desvalorização de movimentos políticos organizados, da ação coletiva e dos partidos, a atomização da ação social em movimentos fragmentários, a valorização do efêmero e do instantâneo, a recusa à pesquisa e compreensão da mudança e do avanço. Dentro do vale tudo pós-modernista, tudo é igual, tudo permanece, tudo é valorizado pelo que “parece ser” e não pelo que “é”.

A dificuldade em se definir o que seja pós-modernismo decorre disto. É um rótulo que designa inúmeras e muitas vezes contraditórias correntes artísticas e intelectuais, que o historiador espanhol Julio Ariostégui definiu, em minha opinião com uma precisão paradoxal, com a expressão “atitude intelectual genérica”.

Um dos marcos fundamentais na formulação do pós-modernismo foi a publicação na França, em 1979, do livro La condition postmoderne, de Jean-Francois Lyortard (traduzido no Brasil com o título O pós-moderno, em 1985), obra que se transformou numa espécie de catecismo inicial desta forma de pensar. Ali está o rompimento com o marxismo e com a tradição iluminista, a pretexto dos desastres que a “razão instrumental” teria provocado. Em outro lugar, Lyotard cita os assassinatos em escala industrial ocorridos no campo de concentração nazista de Auschwitz como exemplo da degeneração da “razão”. Ali está também o “giro linguístico” que punha a ênfase no discurso.


Tudo passava a ser considerado dentro do campo do discurso, sendo o mundo encarado como um conjunto de fenômenos linguísticos. O critério de verdade deixa de ser a correspondência entre o enunciado e o mundo real e objetivo ao qual ele se refere, substituído apenas pela coerência interna do enunciado. Neste sentido, toda e qualquer questão filosófica passa a ser tratada apenas como um problema de linguagem. Ao contrário do processo de conhecimento que busca uma aproximação do Real, houve um deslocamento discursivo do Real. A partir daí, nem mesmo o conhecimento científico é mais importante e há uma recusa a ele (há mesmo uma denúncia do conhecimento científico, como “técnica” ou “razão instrumental”) que fundamenta o desprezo a qualquer possibilidade de explicação objetiva do mundo. E se fortaleceu a ideia relativística de que tudo é válido e todas as explicações verbais (discursivas) seriam legítimas.

O que é "modernidade"?

Termino com uma reflexão e uma pergunta: o que é a modernidade? Para os comunistas e os marxistas, a questão pode estar mal colocada e a “modernidade” se contrapõe ao problema da revolução. A ideia de modernidade define a modernização capitalista do mundo, que se manifestou nos séculos passados na luta contra o passado feudal, e antigo, que precisava ser superado. E a “modernidade” continua descrevendo, na época do declínio do capitalismo e da necessidade da abertura da transição para o socialismo, a modernização capitalista. Neste sentido, ela não traz nada de fundamentalmente novo, pois o moderno, numa compreensão mais profunda e contemporânea, significa rompimento com o capitalismo e alteração não da aparência das relações sociais (com seus modismos consumistas e tecnológicos), mas da essência destas relações, transitando para formas de sociabilidade baseadas na busca do atendimento das necessidades humanas prementes, e não do lucro. Assim, “modernidade” não significa ruptura dentro do sistema capitalista, mas apenas acomodações teóricas sempre com a finalidade de perpetuá-lo e a seu status quo.

.
Vermelho


(*) Este texto é um resumo de minha apresentação ao debate “Pós-modernidade, Cultura e Educação: tensões e contradições”, realizado pelo Coletivo de Cultura do Comitê Distrital do PCdoB de São Paulo (SP), em 6/9/2011. Agradeço à Mazé Leite por ter anotado minha fala e organizado este texto, que revisei para esta publicação e portanto assumo a responsabilidade pelos erros que possam existir nele.

O Socialismo e a Religião


A sociedade contemporânea assenta toda na exploração das amplas massas da classe operária por uma minoria insignificante da população, pertencente às classes dos proprietários agrários e dos capitalistas. Esta sociedade é escravista, pois os operários “livres”, que trabalham toda a vida para o capital, só “têm direito” aos meios de subsistência que são necessários para manter os escravos que produzem o lucro, para assegurar e perpetuar a escravidão capitalista.
A exploração econômica dos operários causa e gera inevitavelmente todos os tipos de opressão política, de humilhação social, de embrutecimento e obscurecimento da vida espiritual e moral das massas. Os operários podem alcançar uma maior ou menor liberdade política para lutarem pela sua libertação econômica, mas nenhuma liberdade livrá-los-á da miséria, do desemprego e da opressão enquanto não for derrubado o poder do capital. A religião é uma das formas de opressão espiritual que pesa em toda a parte sobre as massas populares, esmagadas pelo seu perpétuo trabalho para outros, pela miséria e pelo isolamento. A impotência das classes exploradas na luta contra os exploradores gera tão inevitavelmente a fé numa vida melhor além-túmulo como a impotência dos selvagens na luta contra a natureza gera a fé em deuses, diabos, milagres etc. Àquele que toda a vida trabalha e passa miséria a religião ensina a humildade e a paciência na vida terrena, consolando-o com a esperança da recompensa celeste. E àqueles que vivem do trabalho alheio a religião ensina a beneficência na vida terrena, propondo-lhes uma justificação muito barata para toda a sua existência de exploradores e vendendo-lhes a preço módico bilhetes para a felicidade celestial. A religião é o ópio do povo. A religião é uma espécie de má aguardente espiritual na qual os escravos do capital afogam a sua imagem humana, as suas reivindicações de uma vida minimamente digna do homem.
Mas o escravo que tem consciência da sua escravidão e ergueu-se para a luta pela sua libertação já semideixou de ser escravo. O operário consciente moderno, formado pela grande indústria fabril, educado pela vida urbana, afasta de si com desprezo os preconceitos religiosos, deixa o céu à disposição dos padres e dos beatos burgueses, conquistando para si uma vida melhor aqui, na terra. O proletariado moderno coloca-se ao lado do socialismo, que integra a ciência na luta contra o nevoeiro religioso e liberta os operários da fé na vida de além-túmulo por meio da sua união para uma verdadeira luta por uma melhor vida terrena.
A religião deve ser declarada um assunto privado — com estas palavras exprime-se habitualmente a atitude dos socialistas em relação à religião. Mas é preciso definir com precisão o significado destas palavras para que elas não possam causar nenhum mal-entendido. Exigimos que a religião seja um assunto privado em relação ao Estado, mas não podemos de modo nenhum considerar a religião um assunto privado em relação ao nosso próprio partido. O Estado não deve ter nada a ver com a religião, as sociedades religiosas não devem estar ligadas ao poder de Estado. Cada um deve ser absolutamente livre de professar qualquer religião que queira ou de não aceitar nenhuma religião, isto é, de ser ateu, coisa que todo o socialista geralmente é. São absolutamente inadmissíveis quaisquer diferenças entre os cidadãos quanto aos seus direitos de acordo com as crenças religiosas. Deve mesmo ser abolida qualquer referência a uma ou outra religião dos cidadãos em documentos oficiais. Não deve haver quaisquer donativos a uma igreja de Estado, quaisquer donativos de somas do Estado a sociedades eclesiásticas e religiosas, que devem tornar-se associações absolutamente livres e independentes do poder de cidadãos que pensam da mesma maneira. Só a satisfação até o fim destas reivindicações pode acabar com o passado vergonhoso e maldito em que a igreja se encontrava numa dependência servil em relação ao Estado e em que os cidadãos russos se encontravam numa dependência servil em relação à igreja de Estado, em que existiam e eram aplicadas leis medievais e inquisitoriais (que ainda hoje permanecem nos nossos códigos e regulamentos penais) que perseguiam pessoas pela sua crença ou descrença, que violentavam a consciência do homem, que ligavam lugarzinhos oficiais e rendimentos oficiais à distribuição de uma ou de outra droga pela igreja de Estado. Completa separação da igreja e do Estado — tal é a reivindicação que o proletariado socialista apresenta ao Estado atual e à igreja atual.
A revolução russa deve realizar esta reivindicação como parte integrante necessária da liberdade política. Neste aspecto a revolução russa está colocada numa posição particularmente vantajosa, porque a abominável burocracia da autocracia policial-feudal causou o descontentamento, a agitação e a indignação mesmo entre o clero. Por mais embrutecido, por mais ignorante que fosse o clero ortodoxo russo, até ele foi agora acordado pelo estrondo da queda da velha ordem medieval na Rússia. Até ele adere à reivindicação de liberdade, protesta contra a burocracia e o arbítrio dos funcionários, contra a fiscalização policial imposta aos “servidores de Deus”. Nós, socialistas, devemos apoiar este movimento, levando até o fim as reivindicações dos membros honestos e sinceros do clero, agarrando-lhes na palavra sobre a liberdade, exigindo deles que rompam decididamente todos os laços entre a religião e a política. Ou sois sinceros, e então deveis ser favoráveis à completa separação da igreja e do Estado e da escola e da igreja, a que a religião seja completa e incondicionalmente declarada um assunto privado. Ou não aceitais estas reivindicações conseqüentes de liberdade, e então quer dizer que sois ainda prisioneiros das tradições da Inquisição, então quer dizer que ainda vos agarrais aos lugarzinhos oficiais e aos rendimentos oficiais, então quer dizer que não acreditais na força espiritual da vossa arma, continuais a receber subornos do poder de Estado, então os operários conscientes de toda a Rússia declarar-vos-ão uma guerra implacável.
Em relação ao partido do proletariado socialista a religião não é um assunto privado. O nosso partido é uma associação de combatentes conscientes e de vanguarda pela libertação da classe operária. Essa associação não pode e não deve ter uma atitude indiferente em relação à inconsciência, à ignorância ou ao obscurantismo sob a forma de crenças religiosas. Reivindicamos a completa separação da igreja e do Estado para lutar contra o nevoeiro religioso com armas puramente ideológicas e só ideológicas, com a nossa imprensa, com a nossa palavra. Mas nós fundamos a nossa associação, o POSDR, entre outras coisas precisamente para essa luta contra qualquer entontecimento religioso dos operários. E para nós a luta ideológica não é um assunto privado mas um assunto de todo o partido, de todo o proletariado.
Se assim é, por que é que não declaramos no nosso programa que somos ateus? por que é que não proibimos os cristãos e os que acreditam em Deus de entrar para o nosso partido?
A resposta a esta questão deve esclarecer a importantíssima diferença na maneira burguesa-democrática e social-democrata de colocar a questão da religião.
O nosso programa assenta todo numa concepção do mundo científica, a saber, a concepção do mundo materialista. A explicação do nosso programa inclui por isso necessariamente também a explicação das verdadeiras raízes históricas e econômicas do nevoeiro religioso. A nossa propaganda inclui também necessariamente a propaganda do ateísmo; a edição da correspondente literatura científica, que o poder de Estado autocrático-feudal rigorosamente proibia e perseguia até agora, deve agora constituir um dos ramos do nosso trabalho partidário. Teremos agora, provavelmente, de seguir o conselho que Engels uma vez deu aos socialistas alemães: traduzir e difundir maciçamente a literatura iluminista e ateísta francesa do século XVIII. (1*)
Mas ao fazê-lo não devemos em caso nenhum cair num modo abstrato e idealista de colocar a questão religiosa “a partir da razão”, fora da luta de classes, como não poucas vezes é feito pelos democratas radicais pertencentes à burguesia. Seria um absurdo pensar que, numa sociedade baseada na opressão e embrutecimento infindáveis das massas operárias, pode-se, puramente por meio da propaganda, dissipar os preconceitos religiosos. Seria estreiteza burguesa esquecer que o jugo da religião sobre a humanidade é apenas produto e reflexo do jugo econômico que existe dentro da sociedade. Não é com nenhum livro e nem com nenhuma propaganda que pode-se esclarecer o proletariado se não o esclarecer a sua própria luta contra as forças negras do capitalismo. A unidade desta luta realmente revolucionária da classe oprimida pela criação do paraíso na terra é mais importante para nós do que a unidade de opiniões dos proletários sobre o paraíso do céu.
É por isso que não declaramos nem devemos declarar o nosso ateísmo no nosso programa; é por isso que não proibimos nem devemos proibir aos proletários que conservaram estes ou aqueles vestígios dos velhos preconceitos que aproximem-se do nosso partido. Sempre defenderemos a concepção do mundo científica, é-nos necessário lutar contra a inconseqüência de quaisquer “cristãos”, mas isto não significa de modo nenhum que deva-se avançar a questão religiosa para primeiro lugar, que de maneira nenhuma lhe pertence, que se deva admitir a dispersão das forças da luta realmente revolucionária, econômica e política, por causa de opiniões ou delírios de terceira ordem que perdem rapidamente todo o significado político e são rapidamente deitados para a arrecadação dos trastes velhos pelo próprio curso do desenvolvimento econômico.
A burguesia reacionária preocupou-se em toda parte e começa agora também a preocupar-se no nosso país em atiçar a hostilidade religiosa, para desviar para esse lado a atenção das massas das questões econômicas e políticas realmente importantes e fundamentais, que o proletariado de toda a Rússia, que se une na sua luta revolucionária, está agora a resolver na prática. Esta política reacionária de dispersão das forças proletárias, que hoje se exprime principalmente nos pogroms das centúrias negras, talvez pense amanhã em quaisquer formas mais sutis. Nós, em qualquer caso, opor-nos-emos a ela com uma propaganda, tranqüila, conseqüente e paciente, isenta de todo o avivamento de divergências de segunda ordem, da solidariedade proletária e da concepção do mundo científica.
O proletariado revolucionário conseguirá que a religião se torne realmente um assunto privado para o Estado. E neste regime político, depurado do bolor medieval, o proletariado travará uma luta ampla e aberta pela eliminação da escravidão econômica, verdadeira fonte do entontecimento religioso da humanidade.

As Seis Características Fundamentais de um Partido Comunista

O quadro das forças revolucionárias existentes no mundo alterou-se nas últimas décadas do século XX.
O movimento comunista internacional e os partidos seus componentes sofreram profundas modificações em resultado da derrocada da URSS e de outros países socialistas e do êxito do capitalismo na competição com o socialismo.
Houve partidos que renegaram o seu passado de luta, a sua natureza de classe, o seu objectivo de uma sociedade socialista e a sua teoria revolucionária. Em alguns casos, tornaram-se partidos integrados no sistema e acabaram por desaparecer.
Esta nova situação no movimento comunista internacional abriu na sociedade um espaço vago no qual tomaram particular relevo outros partidos revolucionários que, nas condições concretas dos seus países, se identificaram com os partidos comunistas em aspectos importantes e por vezes fundamentais dos seus objectivos e da sua acção.
Por isso, quando se fala hoje do movimento comunista internacional, não se pode, como em tempos se fez, colocar uma fronteira entre partidos comunistas e quaisquer outros partidos revolucionários. O movimento comunista passou a ter em movimento uma nova composição e novos limites .
Estes acontecimentos não significam que partidos comunistas, com a sua identidade própria, não façam falta à sociedade. Pelo contrário. Com as características fundamentais da sua identidade, partidos comunistas são necessários, indispensáveis e insubstituíveis , tendo em conta que assim como não existe um “modelo” de sociedade socialista, não existe um “modelo” de partido comunista.
Entretanto, com diferenciadas respostas concretas a situações concretas, podem apontar-se seis características fundamentais da identidade de um partido comunista, tenha este ou outro nome.
1ª - Ser um partido completamente independente dos interesses, da ideologia, das pressões e ameaças das forças do capital.
Trata-se de uma independência do partido e da classe, elemento constitutivo da identidade de um partido comunista. Afirma-se na própria acção, nos próprios objectivos, na própria ideologia.
A ruptura com essas características essenciais em nenhum caso é uma manifestação de independência mas, pelo contrário, é, em si mesma, a renúncia a ela.
2ª - Ser um partido da classe operária, dos trabalhadores em geral, dos explorados e oprimidos .
Segundo a estrutura social da sociedade em cada país, a composição social dos membros do partido e da sua base de apoio pode ser muito diversificada. Em qualquer caso, é essencial que o partido não esteja fechado em si, não esteja voltado para dentro, mas, sim voltado para fora, para a sociedade, o que significa, não só mas antes de mais, que esteja estreitamente ligado à classe operária e às massas trabalhadoras.
Não tendo isto em conta, a perda da natureza de classe do partido tem levado à queda vertical da força de alguns e, em certos casos, à sua autodestruição e desaparecimento.
A substituição da natureza de classe do partido pela concepção de um “partido dos cidadãos” significa ocultar que há cidadãos exploradores e cidadãos explorados e conduzir o partido a uma posição neutral na luta de classes – o que na prática desarma o partido e as classes exploradas e faz do partido um instrumento apendicular da política das classes exploradoras dominantes.
3ª - Ser um partido com uma vida democrática interna e uma única direcção central.
A democracia interna é particularmente rica em virtualidades nomeadamente: trabalho colectivo, direcção colectiva, congressos, assembleias, debates em todo o partido de questões fundamentais da orientação e acção política, descentralização de responsabilidades e eleição dos órgãos de direcção central e de todas as organizações.
A aplicação destes princípios tem de corresponder à situação política e histórica em que o partido actua.
Nas condições de ilegalidade e repressão, a democracia é limitada por imperativo de defesa. Numa democracia burguesa, as apontadas virtualidades podem conhecer, e é desejável que conheçam, uma muito vasta e profunda aplicação.
4ª - Ser um partido simultaneamente internacionalista e defensor dos interesses do país respectivo.
Ao contrário do que em certa época foi defendido no movimento comunista, não existe contradição entre estes dois elementos da orientação e acção dos partidos comunistas.
Cada partido é solidário com os partidos, os trabalhadores e os povos de outros países. Mas é um defensor convicto dos interesses e direitos do seu próprio povo e país. A expressão “partido patriótico e internacionalista” tem plena actualidade neste findar do século XX. Pode, na atitude internacionalista, incluir-se, como valor, a luta no próprio país e, como valor para a luta no próprio país, a relação de solidariedade para com os trabalhadores e os povos de outros países.
5ª - Ser um partido que define, como seu objectivo, a construção de uma sociedade sem explorados nem exploradores, uma sociedade socialista.
Este objectivo tem também plena actualidade. Mas as experiências positivas e negativas da construção do socialismo numa série de países e as profundas mudanças na situação mundial, obrigam a uma análise crítica do passado e a uma redefinição da sociedade socialista como objectivo dos partidos comunistas .
6ª - Ser um partido portador de uma teoria revolucionária, o marxismo-leninismo, que não só torna possível explicar o mundo, como indica o caminho para transformá-lo.
Desmentindo todas as caluniosas campanhas anticomunistas, o marxismo-leninismo é uma teoria viva, antidogmática, dialéctica, criativa , que se enriquece com a prática e com as respostas que é chamada a dar às novas situações e aos novos fenómenos. Dinamiza a prática, enriquece-se e desenvolve-se criativamente com as lições da prática.
Marx no “O Capital” e Marx e Engels no “Manifesto do Partido Comunista” analisaram e definiram os elementos e características fundamentais do capitalismo. O desenvolvimento do capitalismo sofreu porém, na segunda metade do século XIX, uma importante modificação. A concorrência conduziu à concentração e a concentração ao monopólio.
Deve-se a Lénine, na sua obra “O imperialismo, fase superior do capitalismo”, a definição do capitalismo nos finais do século XIX.
Extraordinário valor têm estes desenvolvimentos da teoria. E igual valor têm a investigação e a sistematização dos conhecimentos teóricos.
Numa síntese de extraordinário rigor e clareza, um célebre artigo de Lénine indica “as três fontes e as três partes constitutivas do marxismo”.
Na filosofia, o materialismo-dialéctico, tendo no materialismo histórico a sua aplicação à sociedade.
Na economia política, a análise e explicação do capitalismo e da exploração, cuja “pedra angular” é a teoria da mais-valia.
Na teoria do socialismo, a definição de uma sociedade nova com a abolição da exploração do homem pelo homem.
Ao longo do século XX, acompanhando as transformações sociais, novas e numerosas reflexões teóricas tiveram lugar no movimento comunista. Porém, reflexões dispersas, contraditórias, tornando difícil distinguir o que são desenvolvimentos teóricos, do que é o afastamento revisionista de princípios fundamentais.
Daí o carácter imperativo de debates, sem ideias feitas nem verdades absolutizadas, procurando, não chegar a conclusões tidas por definitivas, mas aprofundar a reflexão comum.
É de esperar que o Encontro Internacional na Fundação Rodney Arismendi de Setembro do ano corrente dê uma contribuição positiva para que este objectivo seja alcançado.

Álvaro Cunhal

15 de Setembro de 2001