O Triunfo de Chávez



1. A primeira década do século XXI foi marcada pela presença marcante do fenómeno Hugo Chávez, eleito no dia 2 de fevereiro de 1999 para o cargo de Presidente da República da Venezuela. Sua posições política progrediram através de um mandato de um nacionalismo contido ao anti imperialismo e ao socialismo. Hugo Chávez se declara um revolucionário e o seu regime tem o sido na medida em que desmonta a estrutura liberal do Estado venezuelano, cria novas instituições e cerceia as remanescentes, destruindo o velho instrumento oligárquico e colocando outro em seu lugar. Neste processo Chávez dá uma ótima lição de como tomar poder e subverter a antiga ordem, visto que nas presentes condições o chavismo na Venezuela é implacável e hegemônico, como veremos a seguir.

2. Hugo Chávez conta com forte base e apoio popular. Procura envolver o povo da maior forma possível no processo, não só através de propaganda massiva e políticas ecônomicas populistas, mas também através de um partido de massas amplo e militante somado a novas instituições de cunho participativo(Consejos Communales) que transmitem a sensação de responsabilidade e cumplicidade no povo. Chávez aumenta seu próprio poder e legitimidade ao dividir poderes com o povo.
Chávez é uma figura carismática, icônica, caudilhesca. Sua liderança e seu pensamento que inspiram toda uma revolução configuram uma dominação que podemos chamar de carismática. Teve virtú que forjou sua imagem providencial ao insurgir contra um governo extremamente impopular num momento de grande confusão e pobreza. A fortuna o compensaria posteriormente já que uma Venezuela em frangalhos o elegeria para Presidente, o que reforça seu caráter providencial.

"Deve, pois, alguém que se torne príncipe mediante o favor do povo, conservá-lo amigo, o que se lhe torna fácil, uma vez que não pede ele senão não ser oprimido. (...)Concluirei apenas que a um príncipe é necessário ter o povo como amigo, pois, de outro modo, não terá possibilidades na adversidade. "
- Maquiavel, "O Príncipe"

"Agora eu triunfei pelo apoio de uma facção, quer dizer que esse acontecimento não pode se realizar senão no meio de uma profunda disensão interior. Eu posso dizer ao acaso, mas sem me enganar quais são as causas. Seria um antagonismo entre a aristocracia e o povo ou entre o povo e a burguesia. No fundo, não pode ser senão isso, na superfície será uma confusão de ideias, opiniões, de influências e de correntes contrárias, como em todos os Estados nos quais a liberdade terá tido um momento de revolta. Haverá lá elementos políticos de toda espécie, restos de partidos outrora vitoriosos e hoje vencidos, ambições desenfreadas, cobiças ardentes, ódios implacáveis, terror por todo lado, homens de todas as opiniões, de todas as doutrinas, restauradores de antigos regimes, demagogos, anarquistas, utopistas, todos com mãos à obra, todos trabalhando igualmente por seus lados, pela mudança da ordem estabelecida. (...) no meio dessa divisão de partidos não existe uma força real ou acima senão uma, o povo.

Eu sou, eu mesmo, um pretendente vitorioso, eu trago, suponho, um grande nome histório próprio para agir sobre a imaginação das massas. Como Pisístrato, como César, como Nero mesmo; eu me apoiarei sobre o povo, aí está o "a", o "b" e o "c" de todo usurpados. Lá está o poder cego que dará o meio de tudo fazer impunemente, é a autoridade, é o nome que cobrirá tudo. O povo com efeito se inquietará bem com vossas ficções legais e vossas garantias constitucionais!"
- Maquiavel ficticio de Maurice Joly, em "Diálogo no Inferno entre Maquiavel e Montesquieu", Oitavo Diálogo

"A base de toda autoridade está no proveito daquele que obedece." - Napoleão Bonaparte

3. Chávez tem um bom timing, sabe que cada coisa tem sua hora, sabe conduzir o processo de forma gradual - o povo se assusta com mudanças graduais. Aprendeu bem a lição de que Maquiavel de que a virtude de um Príncipe consiste na flexibilidade para agir segundo as circunstâncias, lição por sinal bem demonstrada por seu maestro Fidel Castro. Sempre cuidadoso, nunca se comprometeu antes da hora certa, indo de um discurso amplo e vago para um mais consistente e definido, pois como disse Napoleão "a melhor maneira de manter sua palavra é nunca dá-la".

"Eu não destruiria diretamente as instituições, mas eu as tocaria uma a uma com um toque de mão imperceptível que lhes desarranjaria o mecanismo. (...) Por baixo das leis primitivas eu faria passar uma legislação nova que, sem anular expressamente a antiga, a disfarçará primeiro, mais tarde a apagará completamente." - Maquiavel ficticio de Maurice Joly, em "Diálogo no Inferno entre Maquiavel e Montesquieu", Oitavo Diálogo

"Em matéria de sistema, sempre é preciso se reservar o direito de rir no dia seguinte de suas idéias da véspera." - Napoleão Bonaparte

4. A constituição já tem a marca bolivariana, a própria República da Venezuela se chama República Bolivariana da Venezuela. Chávez se converteu num fundador de Estados - o próprio Estado tem a sua imagem, e além de ocupar o Executivo mantém hegemonia sob o legislativo(o PSUV mantém mais de 50% das cadeiras da Assembleia Nacional) e a posição de padrinho do poder popular. A influência de Chávez já permitiu em alguns momentos o poder excepcional de legislar por decreto e constatemente ele apela para sua força popular através da arma dos referendos e plebicistos - o ápice da democracia sendo usado contra a democracia liberal, o voto popular se torna um instrumento de governo.

A oposição, mal organizada e desprovida de um líder como Hugo Chávez, se vê obrigada a jogar segundo as regras da legalidade bolivariana ou violar a mesma com o risco de sofrer a devida punição.
"E o voto popular, do qual eu farei instrumento do meu poder, tornar-se-á a base mesa de meu governo.

5. O exército já foi expurgado, reformado e doutrinado. Proclama o lema da Revolução Bolivariana: "Pátria socialista ou morte!" O tenente-coronel Chávez é uma figura inspiradora para todas as Forças Armadas, leais a ele e a sua Revolução. Não obstante, ainda arma o povo com a chamada Milícia Nacional Bolivariana. O poder das armas está com Chávez.

6. A hegemonia ideológica vem sendo conquistada. O anterior domínio da mídia pelas oligarquias foi abalado e estas agora dividem o espaço informativo com o Estado. Nas escolas os jovens já aprendem os fundamentos do sistema em que vivem, pessoas são alfabetizadas com princípios da Revolução Bolivariana e bases do Partido fazem intenso trabalho ideológico nos comitês populares. O próprio Presidente dá orientações através da imprensa, do rádio e da televisão. Mesmo em programas de formação profissional existe o elemento de formação ideológica, vide a Missão Che Guevara.

A criação de novas Universidades e consequente ampliação do acesso a elas permitirá a criação de uma intelectualidade bolivariana(ou pelo menos em débito com o chavismo) e de um novo grupo de técnicos que acabará com o poder de barganha e tendência de oposição do velho - os "técnicos burgueses" serão substituidos pelos "técnicos bolivarianos", aumentando a independência do regime.

7. O Estado aumenta o seu papel na economia e o faz de forma política(não meramente intervencionista). Surge a arma econômica contra a oligarquia e certos setores do empresariado.

8. A oposição tem se limitado plano da política e negilgenciado o plano do político. O poder de Chávez não se reduz a um cargo no executivo e a cadeiras na Assembleia Nacional, se estende para todo o tecido social. O Estado já é bolivariano e o povo é educado para tal - a questão vai muito além do número de votos. A oposição é fraca, a oligarquia se encontra em frangalhos e a classe média reduzida(lembrando que esta é somente um terreno fértil para opositores, mas não inimiga por natureza do chavismo). Tendo estes fatores expostos em conta é perfeitamente razoável afirmar: O TRIUNFO DE HUGO CHÁVEZ FRIAS É IMPLACÁVEL, O SISTEMA É HEGEMÔNICO E NÃO EXISTE UMA ALTERNATIVA AO ATUAL MODELO BOLIVARIANO.

Fontes de citações:

"DIÁLOGO NO INFERNO ENTRE MAQUIAVEL E MONTESQUIEU" de Maurice Joly, Edipro, São Paulo, 2010.
"NAPOLEÃO BONAPARTE - Manual do Líder - Aforismos escolhidos e prefaciados por Jules Bertaut" Napoleão Bonaparte, L&PM, 2006, Porto Alegre.

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